"Fome - Uma biografia do (meu) corpo" e a autoaceitação como um processo






Quando me deparei com esse livro imaginei que a autora fosse me contar como conseguiu amar seu corpo gordo mesmo em uma sociedade preconceituosa. Fui ingênua em esperar um passo-a-passo mágico para o milagre da aceitação. Como uma mulher gorda eu sei que o amor-próprio não é um milagre e nem segue passos, muito pelo contrário, ele é inconstante e penoso. Por isso acho que Roxane Gay conversou tanto comigo em vários aspectos, às vezes jogando a realidade na minha cara, às vezes me confortando e muitas vezes me dizendo sobre a necessidade de buscar esse olhar mais gentil para com meu corpo.


A história de Roxane é muito diferente da minha, mesmo que nossos fins tenham sido parecidos. A autora conta que começou a engordar após um estupro sofrido aos 12 anos onde vários meninos à violentaram. Para poder evitar que isso acontecesse novamente ela blindou seu corpo, o deixando “indesejável”. Em uma série de relatos emocionados e honestos, Roxane conta a dor de ser massacrada por uma sociedade dominada pelo padrão estético e a necessidade de se convencer que nada daquilo foi sua culpa.




A gordofobia é o preconceito sofrido por pessoas gordas. Ao contrário do que muitos acham, falar sobre gordofobia não é falar sobre apologia à obesidade, na verdade é falar sobre o livre ir e vir de corpos gordos sem sofrerem pressão social ou atos de preconceito. Mas, eu entendo o que você pode estar pensando nesse momento, que é fácil resolver isso, só precisa emagrecer. Realmente, emagrecer seria uma fórmula para me livrar desses problemas, mas quando falamos de preconceito e questão estética não estou falando apenas de mim ou do meu corpo, estou falando de uma construção social que precisa ser mudada para comportar a todos, independente de tamanho. Estou falando dos gordos demais, altos demais, magros demais, todos aqueles que se sentem excluídos em uma sociedade doente pelos padrões de beleza. Emagrecer não é mais fácil quando o problema é a forma que foi construído meu olhar sobre mim, onde independente do número que a balança mostre eu sempre estarei insatisfeita. 



Porém, mesmo Roxane, que se dispôs a escrever um relato tão aberto sobre seu corpo, não consegue se blindar do despreparo social. Por mais que você cultive o amor próprio e entenda que o olhar da sociedade está errado, sempre terá uma cadeira com apoio de braços pequena demais para seu quadril, uma catraca de ônibus muito apertada, degraus altos demais, amigos e parentes que camuflam preconceito com preocupação, a pessoa que te dá informações numéricas sobre as taxas de obesidade e aquela que, apesar de magra, sabe tudo sobre a saúde do corpo gordo. Por isso afirmo que se amar é um processo lento e diário. Todo dia se olhar no espelho e se sentir suficiente, linda e merecedora mesmo que todo o resto afirme o contrário.


No fim, o grande ponto é lutar pela conquista de direitos e por mais que você sinta seu amor próprio ser abalado, nunca o deixe cair. Não somos burros ou preguiçosos, apenas entendemos que temos o direito de ocupar todos os espaços que desejamos não importando o tamanho. Isso deveria ser o básico, mas se tornou uma luta para nós. A autoaceitação não é apenas sobre se amar, mas também saber que nunca deverei ser oprimida pelo que meu corpo é, que mereço tudo o que desejo e que não sou apenas esse invólucro externo. Sou uma pessoas como qualquer outra, com amores e tristezas como qualquer outra e que merece andar por aí sem reprimendas. Quando a sociedade passar a entender isso teremos uma população mais livre para se amar e aceitar o amor do outro. 



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