"A Terra é plana" e uma reflexão sobre a acessibilidade do conhecimento científico



Vou ser bem honesta, foi muito difícil assistir a esse documentário com os olhos da empatia. Às vezes a coisa parecia absurda demais ou conspiracionista demais para mim e eu acabava rindo ou soltando comentários de incredulidade. Porém, o documentário disponível na Netlix fez um serviço incrível em nos aproximar dos terraplanistas e entender tudo o que está por trás das suas convicções. No fim, você acaba por entender que existe toda uma condição social que facilita esse tipo de pensamento anticientificista.

Nos primeiros quarenta e cinco minutos de documentário somos apresentados para três terraplanistas famosos dentro de seu meio. Como youtubers de sucesso, eles são as estrelas. Se tornam a inspiração de muitos que tinham vergonha de dizerem em voz alta que acreditam sim na terra plana. É muito interessante quando traçamos um paralelo entre essas três pessoas e percebemos alguns comportamentos iguais. Existe essa eterna negação por toda informação vinda do governo ou da mídia, como se os órgãos governamentais estivessem o tempo todo manipulando ideologicamente uma grande massa da qual eles se recusam a fazer parte. Existe um grande apreço por todo tipo de teoria conspiratória, desde anti-vacina até ideologia de gênero. E existe a alegria de finalmente ter encontrado um grupo para fazer parte, afinal se sentiram deslocado por toda a vida. 

Essas características levam essas pessoas a realmente questionarem o globo pelo simples fato de se negar a acreditarem em uma informação passada pela NASA. Tendo muito claro em suas cabeças que a terra é plana, eles acabam buscando experimentos para tentar provar aquilo que já acreditam. Fica muito interessante de se observar o uso da ciência em uma comunidade anticientificista. Normalmente, para tentar provar algo, os cientistas atacam suas hipóteses de todos os lados para confirmar sua veracidade. Se minha hipótese é “o fogo queima” eu e toda a comunidade científica estaremos dispostos a colocar isso à prova em um movimento de negação. Se mesmo assim minha hipótese se mantém inalterada, ela se torna verdadeira. A diferença é que os terraplanistas não tentam atacar aquilo que acreditam e sim tentam provar pelo meio empírico que aquilo que eles falam é verdadeiro. Dessa forma não existe o processo de negação e minha teoria está protegida. 

Mais para o final do documentário existe a fala de um cientista que mudou toda minha forma de ver os terraplanistas. Ele diz que a ciência é arrogante e se coloca muito distante das pessoas. Comecei a entender que aquelas pessoas não tinham conseguido entrar em contato com a ciência e a tentavam fazer de formas errôneas exatamente porque era isso que tinham em mãos. A forma com que a linguagem científica se coloca em patamares muito altos cria um certo misticismo em volta da mesma fazendo com que as pessoas se afastem da tentativa de alcançá-la e procurem o lugar confortável da ignorância. 

No fim, percebi que devemos cada vez mais tentar expandir a propagação da ciência para todas as pessoas. Precisamos de cientistas que consigam falar para qualquer pessoa ou até mesmo de alguém que possa traduzir toda essa linguagem técnica. Precisamos tirar esse manto místico da academia, tornar acessível e ver as pessoas se informando ao invés de criando teorias da conspiração. Meu trabalho aqui não vai ser condenar os terraplanistas, mas dizer que eles foram vítimas de uma construção social que não permitiu com que eles entrassem em contato com a ciência e o conhecimento os condenando ao lugar comum da ignorância.

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